29/1 – O papel da fotografia no audiovisual na Mostra Tiradentes
O penúltimo dia da Mostra Tiradentes, organizada pela Universo Produção, contou com dois eventos do tipo “Encontro com os filmes”, além de uma conversa sobre fotografia no audiovisual, a ação #CINECBMM e um show ao vivo de Fernanda Abreu. Leia mais:
– Encontro com os Filmes | Mostra Aurora (longas) | O Cerco
O longa-metragem da vez foi “O Cerco”, com participação dos diretores e roteiristas Aurélio Aragão, Gustavo Bragança e Rafael Spínola, da atriz Liliane Rovaris e do técnico de som, montador e produtor Lobo Mauro. Como sempre, havia um crítico convidado que, no caso, foi Cássio Starling Carlos, que ainda contou com a mediação foi de Marcelo Miranda, crítico de cinema.
“‘O Cerco’ me provocou uma série de impactos, pois reflete, o tempo todo, esse presente em que vivemos, de enclausuramento, principalmente porque não há muitas cenas externas no filme. É quase como se não houvesse o lado de fora na experiência do espectador. Algo muito próximo da nossa atualidade, em que vivemos com essa restrição de circulação. E isso afeta nosso modo de pensar. É como se estivéssemos vivendo uma espécie de bloqueio de desejos”, comentou o crítico Carlos.
Já Aragão afirmou se sentir bem com as questões que o trio de diretores/roteiristas considerou importantes. “Este filme partiu de uma sensação corporal, de uma angústia que bateu em 2013, início do processo que desencadeou o momento político-social que estamos vivendo hoje. Foi uma arena, um espaço circular de conversa, onde conseguimos pensar em chaves para elaborar melhor esse sentimento”, disse.
Gustavo Bragança ressaltou que quando o projeto foi iniciado, em 2013, o trio ainda não tinha clareza do produto audiovisual que ia encontrar no final do processo. E, por causa destas camadas de tempo, Rafael Spínola vê o filme como uma espécie de museu da resistência. “Com o passado, o presente e essa resistência angustiada e com o futuro e uma abertura para uma resistência mais livre, com menos medo. O que a gente pode fazer sobre isso? O que sabemos fazer é filme. Por isso, esse longa se tornou inevitável para nós. Falávamos que esse projeto foi feito como quem joga uma pelada, a partir das inquietações e urgências que foram aparecendo. Nesse sentido, é um filme muito horizontal e compartilhado”, comentou .
Para a atriz Liliane, “‘O Cerco’ foi um encontro de “das sensações, inquietações e fantasmagorias que nos incomodavam. A partir do encontro com cada um dos diretores, eles iam me contaminando e surgia uma manifestação que seria feito, pois o roteiro não tinha fala, era tudo improvisado. Foi um processo muito horizontal de construção conjunta”.
A falta de um roteiro no formato tradicional foi um grande desafio para a captação de som e para a montagem, de acordo com o técnico de som, montador e produtor Lobo Mauro. “Apesar disso, o processo foi gostoso e convidativo, o que afeta no processo de criação”. Gustavo Bragança destacou ainda que, por se tratar de uma produção sem financiamento público, o filme só foi possível graças ao grande envolvimento da equipe, que acreditou no projeto.
– Encontro com os Filmes | Mostra Olhos Livres | 1
Nesse painel, foram reunidos realizadores para discutir “Nũhũ Yãg Mũ Yõg Hãm: Essa Terra é Nossa!”, “Amador” e “Irmã”, com mediação da curadora Lila Foster. No caso de “Nũhũ Yãg Mũ Yõg Hãm: Essa Terra é Nossa!” é exemplar nesse sentido, que fala sobre a documentação de uma busca da terra originária de povos indígenas da comunidade maxakali. Assinado por dois indígenas, Isael Maxakali e Sueli Maxakali, e por Carolina Canguçu e Roberto Romero, o filme se caracteriza por esse encontro de povos em prol da resistência e da luta. “É importante ver esse filme para saber como está a situação dos maxakali, impedidos de entrar em suas terras para poderem contar suas próprias histórias”, disse Sueli, num vídeo exibido durante o debate.
A codiretora Carolina Canguçu contou ser este o quarto filme feito em conjunto com a comunidade e o primeiro em que houve uma participação ativa de todos os participantes. “Até então fazíamos a produção técnica e os maxakali decidiam tudo, da concepção ao que filmar. Já nesse, que é um projeto de 2012 sobre a questão territorial, fizemos em conjunto para podermos percorrer aldeias e conflitos em busca de um apanhado histórico de como se chegou ao estado de confinamento ao qual eles estão submetidos hoje”, disse ela.
Também de uma parceria intensa surgiu “Amador”, no qual a diretora Cris Ventura acompanha o artista urbano, poeta, performer e pintor Vidigal, uma das mais criativas e luminosas expressões do underground de Belo Horizonte A proximidade de Cris com Vidigal data de muito antes do filme, vindo de uma vivência constante no cenário cultural da capital mineira e de uma amizade que se formou através da arte. “Tínhamos planos de trabalhar juntos num filme e, logo depois que exibi meu primeiro longa na mostra Aurora (‘Na Minha Mão eu Não Quero Pregos’, em 2013), ele me procurou para registrar uma performance dele no curso de teoria literária que fazia na UFMG”, relembrou a cineasta.
Em relação a “Irmã”, a dupla Luciana Mazeto e Vinícius Lopes contou ter buscado uma diferenciação nesse filme em relação trabalhos anteriores, de cunho mais documental. Dessa vez, optaram por uma ficção de acabamento narrativo acentuado, o que não os afastou do voo poético presente em outros projetos. “Antes a gente filmava registros documentais e, a certa altura, íamos para tons mais fabulares. Quando fomos fazer um filme como ‘Irmã’, aconteceu o movimento contrário, inserindo, na imaginação e na fantasia, elementos das nossas próprias realidades”, pontuou.
– Roda de Conversa | Para a além da luz: fotografia e mise en scene
A direção de fotografia com relação à mise en scene foi tema do bate-papo que contou com a participação de Bárbara Bergamaschi, uma das diretoras de fotografia de “O Cerco”; Lílis Soares, diretora de fotografia de “Novo Mundo”; e Thacle de Souza, diretor de fotografia. Os realizadores comentaram sobre a experiência fotografando filmes de diferentes gêneros, temáticas e perspectivas.
“Eu gosto de pensar a direção de fotografia como, de fato, um fazer criativo. Eu não procuro padrões estéticos, tento sempre achar quem é o fotógrafo no processo criativo e em cada filme esse viés vai mudando. Sobretudo, gosto de pensar a relação com a história e com o ator”, disse Lilis. Já Bárbara falou da experiência em “O Cerco”, apontando o caráter de autoria coletiva do filme. “Eu não sou a única diretora de fotografia. Isso é legal porque O Cerco saiu de um contexto de formação, eu ainda estava na faculdade quando fizemos. As proposições dos diretores não eram diretamente passadas para a equipe de fotografia. A gente tinha que estar sempre atento e acompanhar os atores. Era como se acompanhássemos um evento”. De certa maneira, Souza concordou sobre a fotografia ser em um lugar ambíguo e de troca.
Confira na íntegra: