18a CineBH – Dira Paes estreia como roteirista e diretora em “Pasárgada”, além de atuar, e traz reflexões sobre o tráfico de pássaros

 

Dira Paes, celebrando 40 anos de carreira e com 42 filmes no currículo, lança seu primeiro longa-metragem como diretora, “Pasárgada”. O filme, que estreou oficialmente nos cinemas em 26 de setembro, teve sua pré-estreia nacional no mesmo dia, na CineBH, integrando a programação da Mostra Vertentes. O longa já foi exibido também no Festival de Gramado, inclusive com premiação de Melhor Desenho de Som.

Na trama, Dira interpreta Irene, uma ornitóloga solitária que redescobre sua conexão com a natureza durante uma pesquisa na floresta.

“Eu queria que essa mulher fosse um desafio, uma personagem com um viés diferente, e eu queria participar de todas as etapas. Ela é o meu avesso, uma mulher lunar, e eu fui guiada por isso”, revelou Dira.

A inspiração para o filme veio de uma experiência pessoal sua durante a pandemia da Covid-19, quando se isolou nas montanhas do Arraial do Sana (Macaé, RJ). A região, rica em biodiversidade e parte da Mata Atlântica, é um dos destinos mais procurados por pesquisadores de aves, o que influenciou a criação da narrativa.

Irene, a protagonista, é uma ornitóloga de 50 anos que realiza um trabalho de mapeamento de pássaros na floresta tropical. Guiada por Manuel, um mateiro vivido por Humberto Carrão, Irene confronta suas escolhas e resgata sua essência. A conexão de Dira com a natureza e seu ativismo ambiental foram cruciais para a construção da narrativa. Dados alarmantes sobre o tráfico de animais silvestres no Brasil também motivaram a cineasta a abordar esse tema no filme.

Dira explica que a escolha da profissão de Irene foi influenciada por sua própria observação de pássaros durante o desenvolvimento do roteiro.

“Inspirada pelos versos do grande poeta modernista Manuel Bandeira, comecei a refletir sobre o poema ‘Vou-me embora pra Pasárgada’, e sobre o desejo que todos temos de alcançar o nosso paraíso particular”, conta.

Para transmitir as sensações de Irene, Dira dedicou muita atenção ao desenho de som do filme. “Para uma ornitóloga como Irene, ouvir é ver de olhos fechados. Então a identificação do espectador é vivenciar as nuances daquele mundo de sons”, explica. “Pasárgada” é um filme sensorial que destaca os sons da natureza e sua relação com os personagens.

“Quem dera que pudéssemos voar tão livremente quanto os pássaros”, conclui Dira.

“Pasárgada” é uma produção da Muiraquitã Filmes, Imã Filmes e Baderna Filmes, com coprodução da Globo Filmes e distribuição da Bretz Filmes. O filme recebeu patrocínio do Banco da Amazônia e apoio do Governo do Estado de São Paulo, da Secretaria da Cultura, Economia e Indústria Criativas, do Governo Federal e do Ministério da Cultura, através da Lei Paulo Gustavo.

Compartilhando experiências

Ainda nesta sexta-feira, no Espaço Claro de Conexões, dentro da programação do CineBH, a atriz Dira Paes e o ator Antônio Pitanga discutiram suas experiências na direção de filmes, com mediação do curador da CineBH, Marcelo Miranda. A conversa abordou a visão artística de ambos, tanto na frente quanto atrás das câmeras, e suas vivências no cinema brasileiro contemporâneo.

Pitanga dirigiu “Na Boca do Mundo” em 1978 e “Malês” em 2024.

Eles compartilharam como equilibram suas facetas criativas como intérpretes e diretores; os desafios de transitar entre essas funções e o processo de escrever e dirigir filmes nos quais atuam.

 

Confira uma entrevista com a diretora, roteirista e atriz, Dira Paes.

 

Como foi o processo de aprendizado e descoberta ao dirigir seu primeiro longa-metragem?

Ao dirigir “Pasárgada”, enfrentei o desafio de criar uma história e construir imagem e som. Utilizei o som para guiar a plateia e conduzir o olhar para Irene e sua história. Sou imensamente grata a todos que apoiam o cinema brasileiro. O cinema é um organismo vivo que ganha vida com a plateia, e vocês verão um pouco de mim e dos meus avessos. O filme foi filmado em dezembro de 2020, e ainda estou aprendendo a verbalizar e entender o significado do que criei. Reconheço os riscos envolvidos na realização de um filme e convido a plateia a apreciar essa jornada desafiadora.

 

O que te motivou a se tornar diretora, roteirista e produtora após tantos anos de carreira como atriz?

Eu acho natural que atores e pessoas envolvidas com cinema queiram experienciar um projeto próprio. Durante a pandemia, com o tempo que tivemos, percebi que poderia fazer um filme, especialmente porque meu marido é diretor de fotografia. Queríamos marcar nossa vida com um projeto nosso, e a pandemia nos deu o tempo necessário para isso.

Durante a pesquisa, descobri que o tráfico de animais silvestres é o terceiro maior do mundo, atrás apenas de drogas e armas, e 80% dos animais contrabandeados são pássaros. Isso me tocou profundamente e me motivou a abordar esse tema no filme.

A personagem Irene é uma mulher madura, de 50 anos, que não sabe lidar com os afetos, o que contrasta com a expectativa de que mulheres tenham instinto maternal. Quis trazer essa perspectiva diferente. A maturidade pode nos fazer perder a poesia da vida, e o contato de Irene com a mata é, na verdade, um contato com ela mesma. Ela desperta para sua essência, mas talvez tarde demais.

 

Essa vivência te tornou uma artista mais completa, atuando e dirigindo ao mesmo tempo?

Quando escrevi o roteiro, já estava me forjando naquele espaço. Nunca deixo de ser atriz, mesmo fora do set. É uma organização mental que me mantém conectada e atenta. Na direção, especialmente nas minhas cenas, eu sentia quando algo estava bom. Perguntava ao Pablo se estava tudo certo, e ele confirmava. Com os outros atores, eu sempre verificava se estavam felizes e satisfeitos com as cenas. Confio na minha intuição e na conexão com os atores para garantir que tudo esteja funcionando bem.

 

E sobre o processo de montagem, como é ver o filme ganhar forma após todo o trabalho de escrita, atuação e direção?

Eu queria participar de todos os processos. Nunca tinha participado da montagem de um filme que me envolvesse diretamente. Foi fascinante ver o material ganhar corpo após escrever, construir a personagem, filmar nos locais e com as pessoas certas. Queria ter essa autonomia de voo, literalmente, porque é um projeto cultural que significa muito para mim.

 

 

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