Como a presença de realizadores periféricos está influenciando o cinema?

O cinema brasileiro está mudando. Com a consolidação dos millennials no mercado de trabalho, novas linguagens e temáticas trazidas pela realidade dessas pessoas estão expandindo as perspectivas da produção cultural. Entre esses agentes de transformação, um grupo em especial merece atenção: os jovens de periferia.

No Distrito Federal, um dos grandes exemplos é a produtora CeiCine, em Ceilândia, do cineasta Adirley Queirós. Formado pela Universidade de Brasília (UnB), Adirley é diretor de filmes como Branco Sai, Preto Fica (2014). O longa é reconhecido nacional e internacionalmente, chegando a vencer 11 prêmios no 47º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro.

A produção de Adirley traz novas perspectivas ao exibir narrativas, personagens e estéticas desenvolvidas na periferia por alguém pertencente àquele local. O cineasta problematiza a violência policial sofrida por jovens negros de periferia em um futuro distópico em que não apenas o racismo é evidenciado, mas a capacidade de resiliência desses jovens.

Precisamos refletir sobre a visão controversa da juventude de periferia
É comum a visão da periferia como o lugar da falta, o lugar em que seus moradores são cercados de imensas dificuldades. Elas existem, é claro, mas perceber a periferia apenas por essa perspectiva evidencia apenas nosso conhecimento limitado dela. A periferia é também um terreno fértil para a cultura e para a problematização de contextos sociais.

A periferia está mudando o mundo – e não o contrário. A visão de que a arte remove as pessoas de um suposto cotidiano ruim precisa ser transformada em uma nova perspectiva, onde as pessoas periféricas produzem e utilizam da arte para que a percepção do outro sobre seu cotidiano seja normalizada e desconstruída.

“A presença de cineastas periféricos têm trazido novas estéticas e narrativas ao cinema. Obrigando outros realizadores e espectadores a conviverem com corpos, cores e perspectivas antes silenciadas dessa plataforma. Com isso, o cinema tem se tornado um ambiente mais rico e complexo. Muito ainda há de ser conquistado, mas há de se reconhecer os avanços já feitos”, comenta Josianne Diniz, cineasta formada pela UnB, diretora do curta-metragem Flor do Asfalto.

Iniciativas públicas – como fazer a roda da cultura girar?
Porém, para fazer a roda da cultura seguir girando, é importante que haja mais iniciativas de fomento para que as próprias comunidades consumam o conteúdo produzido por elas. Apesar da grande falta de salas comerciais de cinema em bairros afastados, existem algumas iniciativas que podem ser citadas.

Em Brasília (DF), o Fundo de Apoio à Cultura (FAC) também tem projetos para CineClubes (em sua maioria intermitentes), como o Vale Um Filme, no Vale do Amanhecer, e o Kinofogo, no Varjão.

Também existe o edital FAC Regionalizado, uma política pública de fomento à cultura voltada exclusivamente para regiões periféricas do Distrito Federal. Só neste ano, a previsão é que sejam investidos R$ 13.000.000,00 (treze milhões de reais) no mínimo em 195 projetos.

Sobre o filme “Flor do Asfalto”
O curta acompanha o cotidiano de três jovens moradores do Gama, região administrativa de Brasília. Os três amigos possuem seus espaços particulares, suas casas, família e questões pessoais, mas partilham e se conectam nas andanças de ônibus, nas conversas de barzinho e nas festas. Apesar das diferenças entre eles, todos são afetados pelo mesmo sentimento de desajuste com a própria realidade. Correm atrás do diploma de graduação, mas não podem cursar o que querem, começam a construir uma carreira profissional, mas os ambientes que circulam parecem querer renegá-los a certos espaços, comportamentos e posições. É muito difícil florescer em uma estrutura social que prende o jovem periférico a um único lugar onde lhe é permitido existir.

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