Evento Fix It In Post: Entrada no mercado, diversidade atrás das câmeras e tecnologia no audiovisual
Há um mês atrás, a EBAC – Escola Britânica de Artes Criativas lançou uma série de cursos de graduação e especialização para o mercado audiovisual e, como maneira de reforçar o compromisso com o setor, realizou neste sábado, 10 de agosto, o evento Fix It In Post. O encontro é um festival de audiovisual promovido pela primeira vez pela instituição com foco em falar de todas as partes da produção audiovisual, porém com foco maior na pós-produção.
O próprio nome do evento se refere à máxima conhecida pelos profissionais do setor de “a gente conserta na pós(-produção)”, ou seja, essa fase da produção é extremamente importante, porém deveria ser levada em conta em todos os passos desse processo. No sentido de que, se o projeto é bem feito desde o roteiro, quase nada será “consertado” na pós-produção, apenas o necessário e o trabalho real dessa parte da produção audiovisual.
No total, foram 15 workshops divididos por assuntos de base artística como desenho com modelo vivo, cenografia teatral e Comic Art, ou de base técnica chamados de “software experience”, que abordou programas como Motion Design, além de abordagens sobre animação 2D e 3D. Também tiveram workshops sobre temas como Estabilização de Câmera e VFX.
O evento teve também uma série de debates simultâneos com alguns grandes nomes do mercado audiovisual, incluindo a presença de produtoras como Losbragas, Boutique Filmes, ARVORE Immersive Experiences, O2 Filmes, Bucareste Ateliê de Cinema, Pepita Filmes, Café Royal, Prodigo Filmes, Elixir Entretenimento, bem como outras empresas como DOT Cine, Canon, Vetor Zero, Associação Brasileira de Cinematografia – ABC e Spcine. Destaque também para a participação do Coletivo Gleba do Pêssego, que foi criado por ex-alunos do Instituto Criar, e da iniciativa de igualdade de gênero na produção de filmes publicitários Free the Bid.
Como ser contratado no setor?
Algumas dessas companhias participaram de sessões específicas sobre contratação, o que mantém um profissional nessas empresas, o que buscam e mais. Em bate-papo com executivos da Boutique Filmes, Café Royal e Losbragas, os profissionais concordaram que, apesar de o audiovisual ser uma área criativa, é preciso ter energia para aguentar o cotidiano e as tarefas menos “criativas” necessárias. Para roteiristas, a dica foi aprender a comunicar de maneira efetiva e clara o seu talento e seu portfólio. O que foi unânime entre os executivos foi a exclusão de profissionais “estrelinhas”, arrogantes ou “braço curto”.
Para Cristian Cunha, diretor audiovisual e coordenador de Computação Gráfica na EBAC, a boa comunicação começa de ter um bom conhecimento de sua língua materna. “Tem gente que fala que tem inglês fluente no currículo, mas o Português é intermediário”, brincou, emendando uma crítica de que nenhum profissional deve se limitar por ser “de Humanas ou de Exatas”. Isso porque, para o coordenador, é imprescindível que o aluno ou profissional esteja aberto a somar conhecimento em vez de se limitar. “Inteligência emocional é tudo”, complementou
Tanto Rita Moraes, da Losbragas, quanto Cintia Miura, da Vetor Zero, reforçaram ainda que a visão empresarial é importante desde a faculdade e conta muito na hora de uma entrevista de emprego na área. “A formação é muito importante, mas a curiosidade nos leva mais longe ainda”, disse Cintia, enquanto Rita declarou: “Quem vem de alguma formação, já tem repertório e vocabulário do setor”. Já Gustavo Mello, da Boutique Filmes, também defendeu que o aspecto técnico é fundamental, mas apontou que a energia para fazer os projetos darem certo é que se torna o diferencial. Por sua vez, Chico Neto, da DOT Cine, alertou para o imediatismo das gerações mais jovens, que pode ajudar em alguns pontos, mas não pode ser exagerado. “Para trabalhar nesse mercado, temos que estudar e aprender todos os dias”.
Representatividade: gênero, cor, sexualidade, humanidade na tela e na produção
Em uma mesa sobre diversidade, o evento recebeu Malu Andrade, da Spcine; Barbara Trujillo, da Spcine e ex-Instituto Criar; bem como Caroline Santos e Gabriel Soares, do Coletivo Gleba do Pêssego, formado por oito criadores LGBT, de maioria negra e totalidade periférica que participaram do Instituto Criar.
Essa instituição, como contou Barbara, já tinha mais de 85% dos seus participantes sendo jovens negros logo nos primeiros anos e viu essa porcentagem crescer cada vez mais. Além disso, por ser um espaço de criatividade e acolhimento, acabou por receber também muitos participantes LGBT, com alguns chegando a finalizar o processo de mudança de gênero no instituto. “Por a gente ter se preocupado em receber e acolher mesmo essas pessoas e a relação de aprendizado entre esses jovens ser muito forte, acho que isso deu abertura para pessoas assumirem sexualidade e mudança de gênero”, comentou.
Caroline explicou que o Coletivo é de audiovisual, não se limitando apenas a cinema, e disse que espera em breve ter um CNPJ para a organização. “Não nos contentamos com sempre as mesmas pessoas contando as histórias LGBT e/ou de mulheres. Diversidade e equidade precisam existir dentro do setor”, disse a jovem que hoje atua também na O2 Filmes. Para Gabriel, quando o assunto é a entrada de pessoas negras, especialmente as mulheres negras, entrarem na direção audiovisual depende muito do incentivo público porque o mercado ainda não recebe da maneira que deveria. Porém, para ele a questão da diversidade não precisa ser pautada necessariamente nela mesma: “Não é preciso advogar sobre diversidade para ser diverso, pode ser uma comédia romântica e ter diversidade como algo natural”.
Do lado do Free the Bid, Mariana Yousseff e mais três convidadas debateram a atual situação da mulher como diretora (e outras posições-chave) dentro do mercado publicitário e audiovisual como um todo. A iniciativa Free the Bid, inclusive, é um compromisso que empresas publicitárias concordam voluntariamente em aderir. Nesse acordo, a empresa de compromete a incluir mulheres na concorrência por filmes publicitários. “É um início de quebra do ciclo masculino, no qual só os homens têm grandes repertórios por terem sido os únicos a terem melhores oportunidades. Não resolve todos os problemas, mas traz mudanças significativas”, comentou Mariana.
As executivas afirmaram que mesmo o mercado de beleza tem ainda a predominância de homens na direção de peças publicitárias e que as diretoras têm total capacidade, seja para fazer um filme de beleza ou um filme de carro. “É uma divisão de lucro. Já vi muitas diretoras e técnicas de som e fotografia desistirem do mercado porque não têm espaço”, declarou Jéssica Queiroz, diretora que atua na Paranoid Filmes e também na Netflix. Esta empresa, inclusive, conta com um projeto de codireção apelidado de Shadow, no qual um diretor ou uma diretora “ganha” uma pessoa-sombra que participa de todo o processo para, assim, poder inserir cada vez mais diversidade na direção. Segundo Jéssica, a Netflix está com foco no momento especialmente em mulheres negras.
Outros debates:
Tecnologia – “O cinema historicamente é um conjunto de tecnologias avançadas. Hoje a tecnologia está cada vez mais acessível, temos que dar foco cada vez mais à linguagem”, Marcelo Trotta, ABC – Associação Brasileira de Cinematografia.
Roteiro – “Essa máxima de que falta roteirista no mercado brasileiro não faz sentido. Todo ser humano é um contador de história”, Julio de Santi, Pepita Filmes.